[ Bong Joon-Ho
& Satoshi Kon ]
ANÁLISE ESTÉTICA
Projeto de Análise Estética sobre os diretores Bong Joon-Ho e Satoshi Kon, para a aula de Imagem em Movimento do sexto semestre de Design da ESPM-SP, projeto por Ana Miyazaki, Ana Fellipelli, Carolina Budoya, e Leonardo Baldoni, orientado pela professora
Flávia Stawski.
[ 2020-2 ]
objetivo
Estudar a estética de um(a) diretor(a) eleito(a), entendendo qual é a relação entre o conteúdo abordado nos filmes (tema, roteiro) e sua linguagem (como o(a) realizador(a) expressa esse conteúdo em imagens e sons); bem como a evolução artística deste(a) ao longo
de sua carreira.


apresentação
As escolhas de diretores do nosso grupo foram Satoshi Kon e Bong Joon-ho. Em contraste a escolhas mais convencionais de diretores norte-americanos, optamos por escolher diretores menos conhecidos mas qual o trabalho teve um grande impacto em nossas vidas. Também achamos interessante escolher dois diretores asiáticos, filmes quais não costumam trazer tanta atenção quanto produções nacionais, norte-americanas ou até mesmo europeias.
Ambos os diretores flertam com a experimentação em suas produções, criando muitas vezes filmes com forte estilização estética, e filmes em quais essas estéticas auxiliam o espectador não só com a compreensão maior da narrativa contada mas também a entender o argumento dos mesmos. Como ambos fazem filmes com grande carga temática social, evidenciando os contrastes nas sociedades japonesa e coreana, os gêneros dos filmes costumam flutuar muito entre dramas, suspense, terror, comédia e sci-fi. Acreditamos que tais escolhas conscientes enriquecem a experiência destes filmes e nos ajudam a compreender as nuances em suas temáticas, além de manter as histórias intrigantes e imprevisíveis.
Esperamos com este trabalho trazer lentes diferentes para assuntos que provavelmente já foram explorados, interpretados por mentes criativas e extremamente únicas em seus contextos e em relação à nós mesmo.
Bong Joon-ho
histórico
Bong Joon-Ho é um cineasta, roteirista e produtor sul-coreano, conhecido principalmente por Snowpiercer (2013), Okja (2017) e Parasite (2019). Seus filmes apresentam temas sociais, humor negro, mix de gêneros e mudanças repentinas de tom. Uma das marcas registradas distintivas de Bong sempre foi sua capacidade impressionante de pular entre vários gêneros, muitas vezes subvertendo nossas expectativas enquanto usa sátira política.
Bong graduou-se em sociologia pela Universidade Yonsei, onde era um dos membros do clube de cinema. No começo da década de 1990, completou um programa de estudos de dois anos na Academia Sul-Coreana de Filmes, e enquanto estudava fez curtas-metragens sendo que dois deles, Memory in the Frame e Incoherence, foram selecionados para serem exibidos nos festivais internacionais de cinema de Vancouver e Hong Kong.
Em 1994, dirigiu um curta-metragem chamado White People. Neste ano, o diretor criou seu primeiro filme, Cão que ladra não morde, uma comédia de humor ácido, que se refere à noção de que o mais comum dos indivíduos pode se transformar em um comportamento psicótico graças às armadilhas da vida cotidiana. Tudo é jogado para o efeito cômico, demonstrando a capacidade sempre impressionante de Bong de tirar a comédia do mais escuro dos assuntos.
Seu segundo filme, Memórias de Um Assassino, baseado em uma história real dos primeiro serial killer da Coreia do Sul, fez tanto sucesso comercial quanto crítico. Bong usa a estrutura de um procedimento policial para explorar as tensões entre as populações rurais e urbanas da Coreia do Sul, enquanto um detetive de uma pequena cidade é forçado a trabalhar com um policial da cidade cujos novos métodos parecem quase estrangeiro, rebatendo um ao outro para efeito cômico. Há também uma crítica à burocracia governamental e como ela pode prejudicar o bom trabalho policial e qualquer senso real de eficiência. Mas, o filme opera como mais do que apenas um filme policial satírico, o filme demonstra mudanças de tom, evoluindo de um suspense tenso para sátira cômica, muitas vezes dentro de uma única cena.
Foi em 2006 que Bong alcançou um grande reconhecimento pelo seu trabalho com o filme Gwoemul — O Hospedeiro, um sucesso não só na Coreia como também internacionalmente, estreiando no Festival de Cannes, e recebendo elogia de críticos. O monstro do filme, algum tipo de besta do rio mutante, é o produto da negligência corporativa. É uma alegoria adequada para a destruição ambiental lançada sobre pessoas inocentes pela negligência corporativa e governamental. Enquanto outros filmes desse estilo escolheriam cientistas e oficiais militares como seus protagonistas heróicos, Gwoemul — O Hospedeiro faz o oposto, mostrando esses grupos como incompetentes, despreparados ou autoritários na forma como tentam recuperar o controle sobre uma Seul eclipsada pelo medo e caos. Bong cresceu na Coreia do Sul durante uma era de ocupação militar dos Estados Unidos, e os efeitos em cascata e as ansiedades dessa época estão mais presentes aqui do que em qualquer um de seus outros filmes. 
Em 2009 fez o filme Mother - A Busca pela Verdade, sobre a história de uma mãe que luta para salvar seu filho deficiente de uma acusação de assassinato. Na maior parte de seu tempo de execução, Mother segue as dicas de filmes de detetive, com seus protagonistas descobrindo pistas. No entanto, é nos momentos finais do filme que a Mãe se desdobra em algo muito mais sombrio e muito mais provocativo. A principal protagonista do filme deve enfrentar a possibilidade de que seu filho possa de fato ter cometido o crime, questionando até onde os extremos do amor de uma mãe ira pelo seu filho. O filme estreou na mostra Un certain regard do Festival de Cannes. Bong foi anunciado como um dos membros do World Dramatic Jury do 27.º Sundance Film Festival e anunciado como líder do júri para a mostra Caméra d'Or do Festival de Cannes, ambos em 2011.
Em 2013 Joon-Ho fez seu primeiro filme em Hollywood, a ficção científica pós-apocalíptica Snowpiercer, mostrando a luta de classes sociais com uma forte crítica a contra a desigualdade social e o aquecimento global. O filme é baseado na graphic novel francesa "Le Transperceneige", de Jean-Marc Rochette e Jacques Loeb. O filme é estrelado por Chris Evans, Tilda Swinton, Ed Harris, Octavia Spencer e John Hurt, sendo um grande sucesso comercial e de crítica. A sátira de Snowpiercer é mais ampla e mais superficial quando comparada a The Host ou mesmo Parasite. No entanto, a ficção científica de alto conceito e a construção mundial impressionante apresentam muitos prazeres cinematográficos para Bong. Cada vagão no trem atua como seu ecossistema criativo repleto de imagens surreais, deslumbrantes e até grotescas. Um carro funciona como aquário, outro como boate, um terceiro, uma escola que faz lavagem cerebral nas crianças do trem.
Quatro anos depois, em 2017, Joon-Ho se juntou a Netflix para realizar Okja, estrelado pela jovem Seo hyun Ahn, e tem no elenco Jake Gyllenhaal, Paul Dano e Tilda Swinton, novamente sendo a uma vilã. Em Okja, Bong traz sua sátira para a indústria de empacotamento de carne corporativa e ativismo pelos direitos dos animais por meio da história da jovem Mija e seu “super-porco”. O filme começa a ficar sombrio na segunda metade, com a representação orwelliana da fabricação de alimentos, cheia de imagens assustadoras, e incrivelmente horríveis. Enquanto a capacidade de Bong de entrelaçar terror, comédia e comentários políticos normalmente cria uma atmosfera maravilhosa de imprevisibilidade dentro das cenas, aqui ela parece desconexa e em desacordo com ela mesma.
O auge de Bong Joon-Ho aconteceu em 2019 com seu filme Parasite, filme que faz uma crítica bem humorada e ácida à desigualdade social na Coreia do Sul. Amplamente aclamado pela crítica especializada, o filme venceu a Palma de Ouro e é um dos maiores sucessos de um filme em língua não inglesa nos Estados Unidos, arrecadando mais de 20 milhões de dólares nas bilheterias nas primeiras semanas, sendo também a maior bilheteria da história do cinema sul-coreano. O filme chegou como um dos grandes favoritos na temporada de premiações de 2019/2020, vencendo vários prêmios da indústria cinematográfica, incluindo os Oscars de Melhor Filme Internacional, Melhor Diretor para Joon-Ho e Melhor Filme, tornando-se o primeiro filme em língua não inglesa na história do Oscar a vencer nesta última categoria. Há uma sequência no meio do filme que gira em torno da preparação de um prato chamado "Rom-Don". É uma piada hiper específica, pois “Rom-Don”, ao que parece, é apenas Jjapaguri, um lanche barato e fácil popular que combina duas formas diferentes de macarrão instantâneo. O que torna o prato diferente desta vez, entretanto, é a adição de lombo, transformando uma forma comum e barata de comida em uma exibição de sua riqueza. O Rom-Don em Parasite é uma crítica sutil à maneira como aqueles com riqueza geralmente se apropriam da comida típica da classe trabalhadora, ajustando seus ingredientes para ostentar a riqueza. No final, uma tentativa de “elevar” algo torna-se um sinal de ignorância em relação à contenda e às circunstâncias socioeconômicas que levaram ao surgimento do prato. E, esse é o ponto crucial do filme, da história de uma família pobre que tenta arrumar emprego para uma rica. O que torna o Parasite tão chocante é sua capacidade de ser apreciado tanto em termos viscerais quanto temáticos. Como fica evidente no exemplo de Rom-Don acima, Bong dividiu sua sátira nos momentos mais ínfimos e insignificantes.
Bong Joon Ho, que tanto em seus discursos, quanto em entrevistas já declarou o seu amor ao cinema de grandes diretores asiáticos que o inspiraram, como: Kim Ki-Young, Shohei Imamura e Keisuke Kinoshita e a obras contemporâneas como: “Mad Max: Estrada da Fúria” de George Miller e o recém lançado “Jóias Brutas” de Josh e Benny Safdie.
Um dos filmes clássicos que lhe inspira é “Hanyo, a Empregada” de Kim Ki-young. Tido como a maior influência do diretor para “Parasita”, o drama sul coreano de 1960, se passa majoritariamente em uma casa e conta a história de uma empregada que tenta desmantelar a vida da família de classe alta para qual trabalha. Nas palavras do diretor o filme: “É um melodrama criminal que lida com os desejos sexuais das mulheres e a sociedade coreana na época e as mudanças nas classes sociais. E faz um ótimo trabalho retratando isso.”
Quando “Parasita” estreou, muitos compararam o tom mais sombrio da comédia usada no filme com a assinatura da obra dos irmãos Coen, diretores já citados por Bong Joon-Ho como inspiração para suas obras. Em 2012, ele  incluiu “Fargo”, filme de erros, na sua lista de melhores filmes já realizados.
O drama criminal de 1997, “A Cura,” , por Kiyoshi Kurosawa é citado por Bong Joon-Ho como uma das obras de maior influência em sua carreira como diretor, e está incluído na sua lista de melhores filmes já realizados. Na trama acompanhamos um detetive que está investigando uma série de assassinatos violentos e misteriosos, causados por pessoas que não tem lembrança do que fizeram. Segundo Bong Joon Ho: “Existe uma sensação de horror que escorre por sua espinha enquanto o assiste“.
A estética de Bong Joon-Ho é uma mistura de de gênero; por exemplo, um filme policial se torna um suspense, um horror ganha humor, e etc. O diretor gosta de mostrar as diversas diferenças sociais e conceitos de monstroi; como exemplos, um sujeito no porão, e até mesmo o capitalismo. Todos os seus filmes tem em comum o humor sombrio, montagem ágil e o puro visual. Seus filmes apresentam temas sociais, mix de gêneros, humor negro e mudanças repentinas de tom.
Os idiomas mais fluentes de Bong Joon-Ho não são definidos por fronteiras de países imaginários, palavras em uma página, letras acentuadas ou legendas. É influenciado pela visão e pelo som, e ele os doa com direção. Bong Joon-Ho usa imagens e sons ao nos cercar e imergir. Em vez de apresentá-los a nós em uma superfície plana, suas histórias e emoções são planejadas e bloqueadas em torno de nós e nossos sentidos.

análise da estética
de três filmes
1. parasite

Direção Bong Joon-ho
Produção Kwak Sin-ae; Moon Yang-kwon; Jang Young-hwan
Roteiro Bong Joon-ho; Han Jin-won
Elenco Song Kang-ho como Kim Ki-taek; Jang Hye-jin como Kim Chung-sook; Choi Woo-shik como Kim Ki-woo; Park So-dam como Kim Ki-jung; Lee Sun-kyun como Mr. Park; Cho Yeo-jeong como Mrs. Park; Jung Ji-so como Park Da-hye; Jung Hyun-joon as Park Da-song; Lee Jung-eun como Gook Moon-gwang; Park Myung-hoon como Geun-sae; Park Geun-Rok como Chauffeur Yoon; Jung Yi-seo como Dono da Pizzaria; Park Seo-joon como Min-hyuk (aparição especial).
Gênero comédia negra, drama, thriller
Música Jeong Jae-il
Cinematografia Hong Kyung-pyo
Edição Yang Jin-mo
Companhia(s) produtora(s) Barunson E&A Corp
Distribuição Coreia do Sul CJ Entertainment
Brasil Pandora Filmes
Portugal Alambique Filmes
Lançamento França 21 de maio de 2019
(Festival de Cannes)
Coreia do Sul 30 de maio de 2019
Portugal 26 de setembro de 2019
Brasil 7 de novembro de 2019
Idioma coreano
Orçamento ₩ 13.5 bilhões (US$ 11 milhões)
Receita US$ 257.592.991
 
Parasita é um filme sul-coreano que mistura o suspense ao drama e acrescenta um toque de humor ácido em seu enredo. Dirigido por Bong-Joon Ho, traz uma crítica social muito bem construída à respeito da desigualdade econômica vivenciadas por famílias coreanas. 
A história foi tão bem elaborada, que se tornou o primeiro filme não falado em língua inglesa à ganhar o Oscar de Melhor Filme em 2020, além deste, também ganhou prêmio de Melhor Roteiro Original, Melhor Diretor e Melhor Filme Estrangeiro.
O roteiro acompanha de maneira linear a trajetória da família de Kim (que se encontra abaixo do limiar da pobreza), com seus planos mirabolantes e mentiras para se infiltrar na mansão da família Park (milionária), se estabelecendo nela como parasitas. Até que um acontecimento acaba juntando os dois núcleos familiares e, a partir daí, ocorrem situações questionáveis do ponto de vista da ética e a desigualdade social. 
Dentro da trama, o clímax se desenvolve em um ritmo frenético, em contraste às cenas rotineiras, em um ritmo mais lento e suave. 
Assim como em outros filmes de Bong, os cenários e objetos são de grande relevância para o aspecto final da trama. Em Parasita, o uso de uma complexidade e detalhamento excessivo em objetos de cena e arquitetura de cenários podem ser vistos de maneira muito nítida, onde cada objeto aparece para aumentar ainda mais a imersão na cena, mostrando que os personagens tem uma relação de longo prazo com o local, como por exemplo na casa da família Kim, onde nota-se ao fundo diversos objetos antigos e empoeirados espalhados por todo lado. Já na mansão dos Park, ocorre o oposto: alguns objetos meramente para enfeite em determinados pontos da casa, ou seja, é como se cada coisa estivesse exatamente onde deveria estar, diferente da anterior, onde tudo parece ter sido empilhado e colocado onde havia espaço. 
A arquitetura dos cenários se destacam tão bem que possuem praticamente uma função de personagem dentro da história. Tanto a casa pobre, com seu teto baixo e janela no nível da rua, passando uma sensação de claustrofobia e também de extrema pobreza, quanto na casa rica, uma mansão com tato bem alto, móveis espaçados e uma arquitetura extremamente reta, aumentando a sensação de harmonia e satisfação ao olhar o todo, sem nenhuma poluição visual.
A direção de arte não poderia passar em branco, assim como os outros fatores destacados, ela também entra para contrastar ainda mais as diferentes situações financeiras, de modo que, Kim e sua família aparecem sempre com roupas antigas, cabelos bagunçados e aspecto de suor em seus rostos, quando dentro de sua casa. Já a os integrantes da família Park estão sempre bem vestidos, com roupas visualmente caras. Outro fator que ocorre, é que a própria família pobre ao entrar na mansão também aparecem com roupas bem mais refinadas do que anteriormente, aumentando o aspecto de riqueza que a mansão passa.
Bong faz um uso frequente de enquadramento em profundidade utilizando o primeiro plano, o médio e o plano do fundo), acrescentando o foco seletivo para guiar o olhar do público para o personagem que desejar (normalmente é o que está falando no momento), fator este que evita uma grande quantidade de cortes de cena e aumenta o aspecto de união da família. Em momentos de fala de um único personagem da cena ocorre o close-up.
Se faz o uso de músicas clássicas em todo o filme, nas cenas de tensão, de suspense, de lembranças, etc. Em vários momentos o volume vai aumentando gradativamente, ficando bem alto, o que acaba intensificando ainda mais o suspense da cena.
2. Snowpiercer

Direção Bong Joon-ho
Produção Jeong Tae-sung; Steven Nam; Park Chan-wook; Lee Tae-hun
Roteiro Bong Joon-ho; Kelly Masterson
História Bong Joon-ho e baseado no romance gráfico Le Transperceneige de Jacques Lob, Benjamin Legrand e Jean-Marc Rochette
Elenco Chris Evans como Curtis Everett; Song Kang-ho como Namgoong Minsu; Ah-sung Ko como Yona; Jamie Bell como Edgar; John Hurt como Gilliam; Tilda Swinton como Mason; Octavia Spencer como Tanya; Ed Harris como Wilford; Ewen Bremner como Andrew; Luke Pasqualino como Grey; Alison Pill como Professora; Vlad Ivanov como Franco, o velho; Clark Middleton como Pintor; Tómas Lemarquis como Egg-head; Jean-Marc Rochette (cameo)
Gênero ação; drama; ficção científica
Música Marco Beltrami
Cinematografia Hong Kyung-pyo
Edição Steve M. Choe; Changju Kim
Companhia(s) produtora(s) Moho Film; Opus Pictures; Stillking Films
Distribuição RADiUS-TWC
Lançamento Coreia do Sul 29 de julho de 2013
Idioma  Coreano; inglês
Orçamento US$ 40 milhões
Receita US$ 86.8 milhões
Snowpiercer foi lançado em 2013, é um filme de ficção científica, dirigido por Bong Joon-ho e escrito por baseada na Le Transperceneige, novela gráfica de Jacques Lob. As filmagens ocorreram em Prague, nos estúdios Barrandov. O filme acontece dentro de um trem que viaja ao redor do mundo transportando o resto da humanidade, depois que a terra se tornou inabitável por conta da baixíssima temperatura, graças a tentativa científica falha de parar o aquecimento global. No trem, quanto mais próximo do trem, mais bem colocado na sociedade se é. O roteiro acompanha, de forma linear, a jornada de Curtis Everett, interpretado por Chris Evans, um dos membros da classe social mais baixa do trem, na tentativa de se rebelar contra a frente do trem.
Bong Joon-ho traz fortes críticas à estrutura em que a sociedade funciona através da analogia do trem, para isso, ele faz uso de elementos como o cenário e cores como elementos auxiliares. A parte de trás do trem é representada com pouca luz, consequentemente poucas cores, trazendo uma certa dificuldade para compreender a cena. Ao avançar para os próximos vagões, a luz e cores começam a aparecer. Bong Joon-ho consegue trabalhar muito bem com esse jogo de luz e cores, principais eventos de contraste são a batalha entre a classe mais baixa e os soldados, onde a cena toda é dessaturada, realçando as silhuetas, e a escola onde as cores são vibrantes e inúmeras. Percebe-se também que o diretor difere totalmente os dois extremos do trem: enquanto o fundo é lotado, desorganizado e escuro, a parte da locomotiva carrega uma única pessoa, aspecto limpo e minimalista e iluminada com uma luz branca, quase que divina.
Bong Joon-ho posiciona várias vezes as câmeras de maneira subjetiva, fazendo com que exista a percepção de primeira pessoa durante a narrativa, onde o telespectador faz parte da massa revolucionária. O filme varia entre takes limpos e longos, e trêmulos e curtos. O primeiro ocorre em cenas de não muita ação, de diálogo, como por exemplo a cena em que os personagens sentam para comer sushi. A segunda ocorre em cenas que necessitam desse movimento para exaltar a tensão e movimento da cena, esse movimentos são acompanhados de cortes rápidos e de zoom in, exemplo disse é a cena em que Curtis aponta a arma do atirador em sua própria cabeça e aperta o gatilho para provar que não existem mais munições. O filme também apresenta cenas de slow motion, como a cena da batalha já citada, com o objetivo de exaltar as ações de Curtis e colocar-lo como o herói.
Outro aspecto muito importante que opera de forma inteligente é o uso de direções, ao avançar para frente do trem, o sentido sempre é para a direita, e para recuar é
para a esquerda.
O cenário do filme é essencial, e muito bem elaborado, o filme consegue passar a sensação de espaço pequeno e até claustrofobia. No entanto, o espaço limitado não foi impedimento para a  construção de cenários riquíssimos em detalhes. Cada vagão tem uma função no trem, podendo ser um aquário, uma plantação, uma escola, um bar, uma sauna, cada um desses apresenta uma estética diferente do outro: a escola é lúdica e cheia de cores, a sauna é dominada por um tom de laranja e vapor, o bar é vermelho e luxuoso.
Durante o filme, principalmente ao passar pelas crianças, percebe-se a glorificação feita ao redor do trem e seu motor "eterno", e entende-se que quem o comanda opera como Deus. Bong retrata de maneira excelente essa metáfora ao viajarmos para a frente do trem, na sala do motor, onde no final do filme, Curtis recebe a proposta de ocupar o papel de Wilford. Perdido em um dilema moral, o personagem logo percebe que nada daquilo é divino, é apenas um sistema criado pelo homem, e é um sistema quebrado que funciona às custas da massa e do trabalho infantil.
Em Snowpiercer existem três tipos de personagem: o revolucionário, o conformista, e o extremista. No início é muito intuitivo afirmar que estes papéis são ocupados por Curtis, Namgoong e Wilford, respectivamente. No entanto, é apenas no final do filme que algumas peças são reveladas, o fato de Wilford ser o informante de Curtis a fim de controlar a população do trem e amigo de Gillian. E também Kang-Ho, que aparentava ajudar Curtis só pela droga que recebia, mas que na verdade tinha a missão de explodir uma das portas do trem para viver no mundo lá fora. Tudo isso faz com que esses papéis sejam repensados
pelo telespectador.
Importante ressaltar que, assim como em Okja, Bong utiliza de mais instrumentos linguísticos além do inglês, graças aos personagens Yona e seu pai Namgoong. Além disso, em meio a toda ação e tensão do filme, o diretor inclui seu humor satírico ao ironizar personagens como a antagonista Mason, que apresenta personalidade tão alienada à sua bolha quanto Lucy,
em Okja.
3. Okja

Direção Bong Joon-ho
Produção Dede Gardner; Jeremy Kleiner; Lewis Taewan Kim; Dooho Choi; Seo Woo-sik; Bong Joon-ho; Ted Sarandos
Roteiro Bong Joon-ho; Jon Ronson
História Bong Joon-ho
Elenco Ahn Seo-hyun como Mikha, uma jovem fazendeira que cuida de Okja; Tilda Swinton como Lucy Mirando, a poderosa CEO da Mirando Corporation buscando lucrar com Okja; Paul Dano como Jay, o líder de um grupo ativista de direitos dos animais; Jake Gyllenhaal como Dr. Johnny Wilcox, um dedicado zoológo e personalidade da TV; Byun Hee-bong como Heebong; Steven Yeun como K, um ativista de direitos dos animais; Lily Collins como Red, uma ativista de direitos dos animais; Yoon Je-moon como Mundo Park; Shirley Henderson como Jennifer; Daniel Henshall como Blond, um ativista de direitos dos animais; Devon Bostick como Silver, um ativista de direitos dos animais; Choi Woo-shik como Kim; Giancarlo Esposito como Frank Dawson, um associado da Mirando Corporation.
Gênero ação; aventura
Música  Jaeil Jung
Cinematografia Darius Khondji
Edição Yang Jin-mo
Companhia(s) produtora(s) Plan B Entertainment; Lewis Pictures
Kate Street Picture Company
Distribuição Netflix
Lançamento (Cannes) 19 de maio de 2017
Estados Unidos 28 de junho de 2017
Brasil 28 de junho de 2017
Portugal 28 de junho de 2017
Coreia do Sul 29 de junho de 2017
Idioma inglês; coreano
Orçamento US$ 50 milhões
Um filme sci-fi produzido juntamente com a Netflix e dirigido por Bong Joon-ho. O filme traz o questionamento sobre a indústria e o consumo de carne, evidenciando o corporativismo frio por trás das propagandas e campanhas de marketing de uma indústria exploratória.
O roteiro do filme é linear, e acompanha a jovem Mija na tentativa de salvar seu “super-porco”, Okja, da empresa Mirando, que busca revolucionar o mercado carnista com
o novo produto.
O filme tem início com Lucy, CEO da Mirando, apresentando a nova campanha de sua empresa, uma competição entre vinte e seis fazendeiros espalhados por todo o mundo para criar o melhor dos “super-porcos" em dez anos. Em sequência, dez anos se passaram, a jovem Mija, interpretada por An Seohyun, junto de seu avô criaram um dos “super-porcos” nas tranquilas montanhas da Coreia do Sul. No entanto, Okja é levado volta à Nova Iorque para seu desfile e posteriormente para ser transformada em alimento. Surpreendida com a notícia, Mija embarca em uma missão de resgate para salvar o “super-porco” do matadouro. É assim que, já em Nova Iorque, a jovem encontra o grupo ativista ALF (Animal Liberation Front) que a ajudará em sua jornada.
Característica muito evidente do diretor é o de ferramentas linguísticas além do inglês, como e Okja, o qual Mija somente domina sua língua materna - o coreano. No entanto, a barreira linguística não é problema para o desenvolvimento da personagem ou do filme. 
Em meio à críticas e questionamentos levantadas, Bong é capaz de inserir o humor satírico que vemos, por exemplo, em personagens como Lucy Mirando, a qual é totalmente infantilizada, desde suas roupas sempre rosa, ou sua assinatura com carinha feliz, mesmo sendo a CEO da coorporativa Mirando. 
Assim como em Snowpiercer, em Okja cenários, objetos de cena e figurinos são essenciais para a construção da crítica por trás do filme. Exemplo disso é o uso de cores: Enquanto na fazenda, no início do filme, sempre a paleta é saturada, ressaltando o divertimento que Mija e O "super-porco" experienciam nessa etapa. Quando Okja é levado para cidade, e mantido trancado em uma sala, a paleta cromática muda para tons de cinza e preto, revelando a tensão ou até tristeza da cena. Não só isso, assim como já citada antes, as cores que incorporam o figurino de Lucy Mirando é sempre em volta do rosa bebê, reafirmando a essência infantil da personagem. Outro exemplo, é Nancy, irmã gêmea de Lucy, representadas por tons de verde escuro, junto com sua personalidade extremamente corporativista, somente focada em dinheiro e progresso empresarial. E com o uso da cor vermelho, Mija se destaca tanto do mundo corporativista tanto quanto do grupo ativista ALF, o que nos mostra um símbolo de rebelião. Desse modo, o uso de figurino em no filme é uma ferramenta para a melhor compreensão do personagem.
O filme é sempre acompanhado do som ambiente, a trilha sonora aparece só em cenas de clímax e ação, com o objetivo de envolver o espectador à cena. Exemplo disso é quando Okja luta para evitar que Mija caia de um penhasco nas montanhas. 
Importante ressaltar que esta foi a primeira produção que Bong Joon-ho trabalhou com efeitos visuais estrelando um dos personagens mais importantes sendo através de um computador. Todo dia de filmagem foi realizado revisão dos takes para possíveis feedbacks e ideias, o que mostra a atenção do diretor
O enquadramento como primeiro plano está muito presente no filme. O movimento de câmera é pode ser feito tanto em ritmos mais frenéticos quanto mais discretos, tudo depende do contexto em que o filme se apresenta, em cenas de fuga/ ação a câmera busca acompanhar o movimento e exaltar a agitação da cena, por exemplo a cena em que o "super-porco", a jovem e o grupo ativista correm pelo metrô.
Satoshi Kon
histórico 
Satoshi Kon foi um diretor, roteirista, animador e mangaká japonês, conhecido principalmente pelos filmes de animação Perfect Blue (1997), Tokyo Godfathers (2003), e Paprika (2006). Seus filmes se destacam pela complexidade psicológica, personagens e planos de fundo realísticos, e a distorção do sonho e da realidade. Em contraste com as realidades mágicas animadas do Studio Ghibli, as realidades de Kon são completamente baseadas na era moderna, enraizado no entrelaçamento de identidade e tecnologia.
edição do mangá de Akira, que virou um filme animado na década de 80, extremamente aclamado pela crítica e pela audiência até os dias atuais.
O artista se destacou na indústria cinematográfica quando começou a criar seus próprios filmes animados, dirigindo-os e roteirizando-os, sendo conhecido por dirigir somente obras de sua autoria. A grande maioria de sua filmografia foi animada pelo estúdio Madhouse — o estúdio é conhecido por produzir animes como Hunter x Hunter, One Punch Man, Death Note, e outros.
Satoshi se formou em design gráfico na Musashino Art University. Após a faculdade, começou sua carreira como um mangaká na Young Magazine. 
Começando como um artista de mangá e subindo na indústria, Kon trabalhou com muitos profissionais respeitados da indústria, incluindo Mamoru Oshii (Ghost in the Shell) e Katshuiro Otomo (Akira). Em 1995, Kon foi roteirista, artista de layout e diretor de arte do curta Magnetic Rose. Foi nesta curta peça que ele começou a desenvolver sua mistura de realidade e fantasia.
Em 1997, Kon começou a trabalhar em sua estreia como diretor, um filme baseado no romance de Yoshikazu Takeuchi de mesmo nome, Perfect Blue. A história é sobre uma garota chamada Mima, que, depois de querer deixar o estilo de vida de ídolo J-pop com tom inocente, deixa seu grupo musical “CHAM!” para iniciar sua carreira como atriz. Tendo que provar seu valor nesta nova indústria, seu primeiro papel como atriz é em um drama policial chamado ‘Double Bind’, onde ela interpreta uma vítima de estupro. Após uma mudança na carreira, seus fãs ficam extremamente chateados e irritados, e a chamam de traidora e suja. Com a pressão de sua nova carreira, sua reputação em jogo e uma perseguidora em potencial, o estado psicológico de Mima é questionado. Perfect Blue foi contra a corrente de outros filmes de anime. Tinha temas e personagens adultos e se passava em um espaço do mundo real: a Tóquio contemporânea. Em vez de robôs gigantes e terras fantásticas, o filme era um thriller psicológico e violento para o público adulto. É focado em assuntos da vida real que refletem questões dentro das imagens dos ídolos pop do Japão e da cultura online. Para Kon, Perfect Blue não estava focado na ideia da celebridade, mas mais no eu público e no eu real de uma pessoa, e no caso de Mima, ela não consegue diferenciá-los. A violência sexual e sangrenta chocou o público por causa de seu formato de desenho animado. Perfect Blue é de longe o filme mais perturbador de Kon; no entanto, muitos de seus temas continuaram em seus outros filmes menos violentos.
Em Millennium Actress, dois cineastas rastrearam uma famosa estrela de cinema aposentada chamada Chiyoko Fujiwara, que eles desejam entrevistar para um documentário. Uma das entrevistadoras, Genya, é fã de longa data de Chiyoko e tem uma chave para dar a ela, um bem pessoal de Chiyoko que ela perdeu anos atrás. Quando recebe a chave, ajuda a falar sobre sua famosa carreira no cinema e também sobre sua vida pessoal. A história se entrelaça dentro e fora das performances de Chiyoko na tela e seu objetivo pessoal de perseguir um pintor misterioso por quem ela se apaixonou. Diferente de seus outros filmes, Millennium Actress é conhecida por promover a ideia do estilo de edição contínuo de Kon, usando uma técnica de ilusão de ótica que "enganam os olhos". A edição é usada para mostrar o controle de Chiyoko sobre sua identidade como atriz e seu verdadeiro, sendo constante e literalmente correndo de uma cena para a outra. Sua corrida parece quebrar o tempo e o espaço. 
Em Tokyo Godfathers, na noite de véspera de Natal, três moradores de rua encontram um bebê recém-nascido que foi abandonado em uma pilha de lixo. Gin, Hanna e Miyuki (uma bêbada desesperada, uma mulher trans e uma adolescente fugitiva) planejam encontrar a mãe do bebê e devolvê-lo a ela. Enquanto o trio se propõe a encontrar pistas e seguir pistas, eles esbarram em pessoas de seus passados ​​e se encontram em uma série de circunstâncias. Suas personalidades se refletem em um amor e ódio mútuos simultâneos um pelo outro. Combinado com o narrativo do milagre de Natal, é um filme engraçado, mas que lida com um problema sério da crescente população de desabrigados de Tóquio.
Em Paprika, uma nova invenção de tratamento psicoterápico foi criada, chamada DC Mini, que permite que psicólogos e cientistas tenham a capacidade de visualizar os sonhos das pessoas. Um ladrão roubou vários DC Minis e os está usando para entrar na mente das pessoas ilegalmente. Uma cientista chamada Chiba, junto com seus colegas e um detetive, tenta capturar o ladrão e recuperar a tecnologia roubada com a ajuda de uma garota hiperativa dos sonhos chamada Paprika. Continuando no tema de misturar realidades, Kon desta vez faz a junção entre a realidade e os sonhos. Usando a ideia de sonhos como uma consciência reprimida, os sonhos de Paprika são coloridos, fantásticos e selvagens.
Todas suas animações possuem uma carga psicológica bem complexa, possuindo roteiros rebuscados, personagens bem construídos e plot twists chocantes. Fora o conteúdo rico e destinado a atender o público adulto e não infantil, suas animações também possuem uma produção técnica bem a frente da época em que foram realizadas. Algumas de suas obras como “Paprika” e “Perfect Blue” serviram de inspiração para filmes de Hollywood como “A Origem”, “Réquiem para um Sonho” e “Cisne Negro”. Christopher Nolan disse ter se baseado Inception em Paprika para a criação do longa, várias referências podem ser encontradas
no filme.
Ao total, o cineasta dirigiu 7 obras-animadas — incluindo séries, longas e curtas —, roteirizou 10 e animou 6 obras. O seu mais novo filme “The Dreaming Machine” não chegou a ser finalizado, devido ao estado crítico de saúde que Satoshi se encontrava na época, resultando em sua morte em 2010 devido a um câncer no pâncreas.
Mexendo com o psicológico do personagem e do próprio telespectador, Satoshi se destaca pelas técnicas que ele utilizava. Buscando inovar, Kon misturava a realidade com imaginação, fazendo o próprio telespectador pensar se aquilo realmente está acontecendo, até nos passando uma sensação de que nós estamos vivendo aquilo, dando um tipo de desconforto em alguns momentos. Seu uso de certas técnicas de cinema e animação de transições, intercalações e cortes combinados fazem com que as edições de seu filme fazem com que o espectador tente constantemente adivinhar e reavaliar o que está assistindo. Por causa disso, Satoshi ficou conhecido como um gênio da direção japonesa, influenciando diretores de Hollywood na produção de grandes filmes. 
 análise da estética
de três filmes

1. Perfect Blue

Direção Satoshi Kon
Produção Hiroaki Inoue
Elenco Junko Iwao como Mima Kirigoe, protagonista; Rica Matsumoto como Rumi, assessora de Mima; Shinpachi Tsuji como Tadokoro, gerente de Mima; Masaaki Ōkura como Uchida, perseguidor Me-Mania; Yōsuke Akimoto como Tejim; Yoku Shioya como Takao Shibuya; Hideyuki Hori como Sakuragi; Emi Shinohara como Eri Ochiai, atriz Masashi Ebara como Murano; Kiyoyuki Yanada como diretor do Double Blind; Tōru Furusawa como Yatazaki; Emiko Furukawa e Shiho Niiyama como Yukiko e Rei, integrantes do grupo "CHAM"; Akio Suyama como Tadashi Doi.
Género Mistério, suspense, drama
Música Masahiro Ikumi
Empresa de Produção Madhouse
Distribuição Sony Pictures Entertainment Japan
Data de lançamento 5 de agosto de 1997 (Festival de Fantasia);
28 de fevereiro de 1998 (Japão)
País Japão
Idioma  Japonês
Orçamento ¥90 milhões (US $ 830.442)
Bilheteria $768.050 (apenas EUA e Reino Unido)
Perfect Blue é uma adaptação da novela de Yoshizaku Takeuchi, “Perfect Blue: Complete Metamorphosis” e a estréia de Satoshi Kon como diretor. Apesar das diferenças do material original, Perfect Blue carrega a essência da crítica social do livro, introduzindo seus conflitos como metáforas que permeiam toda linguagem do filme e aplicando muitas de suas cargas visuais e estilizações que marcam os filmes de Satoshi.
O roteiro segue a vida de Mima Kirigoe, e começa com seu último show como “pop idol” e anúncio de sua transição de cantora para atriz. Mima então é stalkeada por um homem incapaz de aceitar essas mudanças na vida de sua cantora favorita e procede em matar todos qual acredita terem “danificado” sua imagem. A trama roda sobre as personagens Rumi (agente de Mima e ex pop idol), Tadokoro (contato com o mundo do cinema e co-agente de Mima) e o stalker “Me-Mania”, que manipulam de formas sutis (e por vezes extremamente violenta) a vida de Mima conforme suas opiniões e desejos sobre sua imagem, tudo isso enquanto Mima briga internamente para distinguir realidade e fantasia, enquanto luta (literal E figurativamente) contra sua identidade, tomada por um fantasma que à assombra. Depois de concluir filmagem na série qual foi contratada, Mima é atacada por seu stalker mas consegue o matar em um ato de autodefesa. De volta em seu apartamento perto do final do filme, é revelado que sua agente e amiga Rumi era quem se passava pela versão antiga pop idol de Mima e as duas entram em um último confronto, resultando no sucesso de Mima e a internação de Rumi diagnosticada com transtorno dissociativo de identidade. Com uma premissa forte e um bom material de inspiração, Satoshi desconstrói e demonstra de forma não tão exagerada vários aspectos da cultura “idol” do japão, ao mesmo tempo que cria uma trama psicológica e um mistério de assasinato, todos ancorados no conflito interno da protagonista Mima e nas consequências humanas de um ambiente cultural tóxico e fanatismo (este demonstrado de diversas formas). A inclusão de subtextos sexuais também fomenta a discussão de empoderamento de corpos femininos, machismo estrutural, agência humana e traça paralelos assustadoramente reais com o contexto do setting do filme e do nosso mundo, além das consequências pessoais e psicológicas dos mesmos. Os gêneros flutuam entre terror, thriller psicológico, drama e ação, enfatizando a pluralidade contextual e nuance do filme.
O filme inteiro é extremamente consciente do seu uso de luz, espaço e enquadramento. Devido ao aspecto de confusão psicológica intensa, Satoshi utiliza de algumas metáforas visuais (umas mais sutis e outras mais claras) para trazer o público para dentro da loucura e da mente da personagem principal, não conseguindo distinguir entre a realidade, a atuação, o sonho e a desilusão. Ele o faz especificamente de três maneiras: 1) A mudança consciente da saturação, exposição e aspecto geral da luz em cada corte; 2) O uso predominante de azuis e vermelhos e 3) O uso de cortes visuais correspondentes entre as cenas. As mudanças de luz significam muitas coisas no filme, mas principalmente criam a ilusão de conforto nos momentos iniciais do filme para depois, quase que exclusivamente, significar a desconexão entre ilusão e o mundo real. Cenas que realmente aconteceram, acontecimentos prováveis e dentro do escopo da realidade, acontecem em ambientes menos saturados, exposição baixa e luzes naturais, enquanto as cenas que desafiam a nossa percepção de realidade são feitas com luzes exageradas e fora de lugar, e cores extremamentes saturadas, criando um contraste quase imperceptível se não reparado com intenção, mas que afeta nosso subconsciente a fazer tal distinção e abrir questionamentos parecidos com as da protagonista. O vermelho e o azul, além de representar o esperado de um uso básico de teoria de cor, servem tanto para o desenvolvimento psicológico das personagens quanto um significante da loucura e ilusão, enquanto o azul nos passa a sensação do mundano e tradicional, o vermelho traz a ideia de progresso e exagero, sua inclusão quase sempre significativa de um lapso entre a percepção da realidade das personagens. Por último, as transições de cena quase todas acontecem por associação visual ou contextual, como um movimento transferido para próxima cena, flashes indistinguíveis que parecem encerrar momentos sem parcimônia, cenários se transformando sem aviso prévio. Todos esses artifícios ajudam a criar um ritmo rápido e uma atmosfera de confusão e dúvida, principalmente no segundo ato do filme. Esse ritmo é contrastado com alguns momentos quieto e sozinhos de Mima enquanto contempla essa mudança brusca e imperceptível de realidades, ao mesmo tempo que reflete sobre sua carreira e vida pessoal. Essas metáforas e ferramentas visuais podem passar desapercebido em uma primeira visita ao filme, mas o impacto que causa tanto em suas escolhas estéticas como em sua percepção geral como obra são imediatamente sentidos pela audiência.
Perfect Blue também faz muito bem o uso de cenários, criando um ambiente que reforça os aspectos humanos das personagens e nos ajuda a simpatizar com os mesmos, ou os arranca de toda característica e personalidade só o suficiente para nos questionarmos da realidade dos mesmos. Sua trilha sonora, feita por Masahiro Ikumi, complementa a dualidade do filme com 8 trilhas que percorrem sobre o filme, 4 músicas pop que enfatizam as qualidades hyper exageradas e manipuladas da temática idol e 4 que complementam o desenvolvimento das personagens principais de forma mais permeante mas menos excêntrica.
2. Paprika 
Direção Satoshi Kon
Produção Masao Takiyama; Jungo Maruta
Roteiro Seishi Minakami; Satoshi Kon
Elenco Megumi Hayashibara como Dra. Atsuko Chiba; Tōru Furuya como Dr. Kōsaku Tokita; Tōru Emori como Dr. Seijirō Inui; Katsunosuke Hori como Dr. Toratarō Shima; Akio Ōtsuka como detetive Toshimi Konakawa; Kōichi Yamadera como Dr. Morio Osanai
Gênero Anime; ficção científica
Música Susumu Hirasawa
Cinematografia Michiya Katou
Empresa de Produção Madhouse
Distribuição Sony Pictures Entertainment Japan
Idioma Japonês
Data de lançamento 2 de setembro de 2006 (Veneza); 25 de novembro de 2006 (Japão)
Receita $944,915
Orçamento ¥300 million
Bilheteria $944,915
Paprika é o último longa-metragem produzido por Satoshi Kon e provavelmente seu filme mais conhecido. É possível ver na obra o acúmulo das experiências de Satoshi como diretor e roteirista. Ele queria, com este filme, explorar a relação dos humanos com o imaginário dos sonhos e a tecnologia, utilizando de suas respectivas linguagens e universos simbólicos na construção do roteiro e sua animação.
O roteiro de Paprika segue a personagem principal de mesmo nome, uma detetive/terapeuta do sonhos/alter-ego da personagem Chiba Atsuko em um futuro próximo onde um protótipo em desenvolvimento chamado “DC Mini” nos permite entrar conscientemente no mundo dos sonhos, tanto os nossos quanto dos outros, além de gravá-los. A trama segue as personagens Toshimi Konakawa, um detetive e paciente de Paprika, Chiba Atsuko, Tokita Kosaku e Toratarō Shima, três doutores e cientistas na empresa que criou DC Mini, após alguns dos protótipos são dados como roubados, enquanto Paprika utiliza o DC Mini para tratar os traumas do detetive Konakawa, sem o consentimento ou sabedoria do CEO da empresa. A equipe então segue os rastros de outro membro da equipe que parece ter roubado o DC Mini, quando se deparam com uma conspiração de sonhos que parecem estar crescendo no subconsciente coletivo de todos que fizeram uso do DC Mini, chegando a ponto de quebrar as barreiras entre sonho e realidade. O filme foca primariamente na personagem Chiba Atsuko e seu alter-ego Paprika, e se concentra não necessariamente na resolução da “história” do filme mas no desenvolvimento das personagens que o compõe. No final, o diretor da empresa era a pessoa por trás dos sonhos e planejava parar a continuação do projeto e dominar o mundo dos sonhos para si só.
Durante todo o filme, Satoshi Kon utiliza de referências diretas e simbólicas em todos os contextos das narrativas, como por exemplo um sonho que espelha cenas de filmes famosos, não só pelo uso das cenas em si, mas devido a conexão da personagem com o mundo do cinema. Como em outros filmes do diretor, o cenário é parte importantíssima da construção do mundo, agindo quase como uma personagem extra e criando constantes mudanças de paradigma de realidade nas personagens. Grande parte das cenas também funciona como uma “lógica dos sonhos”, onde qualquer conexão simbólica e/ou puramente visual se transforma em elementos utilizáveis pelas personagens para modificar seus arredores. Essa energia caótica e imprevisível, junto com as técnicas implementadas pelo diretor na linguagem do filme, causam um ritmo frenético e uma sensação de exploração incrível, esses também contrapostos com cenas mais calmas para tentarmos processar os acontecimentos.
Como em Perfect Blue, mas ainda mais aperfeiçoado por seus anos de prático, Satoshi ainda utiliza as alterações conscientes da saturação, exposição e aspecto geral da luz em cada corte; e o uso de cortes visuais correspondentes entre as cenas. Esse uso é tão frequente e marca tanto o estilo do diretor que, apenas nos primeiros minutos de introdução do filme, é usado mais de 20 vezes, uma escolha inteligente que dita o tom de todo resto da obra. Seus usos também são similares aos de Perfect Blue, reforçar os aspectos de dualidade das personagens, desorientar o espectador e borrar a linha entre a realidade e o irreal, neste caso os sonhos ao invés da psicose de Perfect Blue.
Apesar da estética fantástica e colorida presentes, as personagens de Satoshi, como em todas as suas obras, são marcadas pelo distanciamento com a estilização crescente dos animes no japão da época, criando uma sensação muito mais próxima da realidade e, curiosamente, tornando as personagens muito mais humanas e relacionáveis, e se aproveitar deste aspecto bem centrado de seu filme e facilita a criação da nuance que essas personagens transmitem. O som no filme é usado com parcimônia, apenas o suficiente para nos ajudar a entrar na estética do filme, o tema de abertura do filme sendo a música mais memorável do filme, abraçando totalmente os aspectos lúdicos, leves e rápidos do filme, garantido a qualidade de sonho que permeia a obra.
Com tudo isso em mente, Paprika é, sem dúvida, um filme sobre sonhos. Sonhos literais, aspiracionais e coletivos. Seu argumento e temática, junto da edição incrível de Satoshi, cria uma experiência única e que enfrenta diretamente (literal ou subconsciente) estes conceitos através da jornada emocional de cada personagem, e abre espaço para discussões filosóficas como ID, Ego e Superego de Freud, ou a teoria dos sonhos de Jung, além de tocar em aspectos culturais de progresso, consciente coletivo e individualidade.
3. Tokyo Godfathers

Direção Satoshi Kon
Produção Shinichi Kobayashi; Masao Takiyama; Taro Maki
Roteiro Keiko Nobumoto; Satoshi Kon
História Satoshi Kon
Elenco Tōru Emori como Gin; Yoshiaki Umegaki como Hana; Aya Okamoto como Miyuki; Satomi Koorogi como Kiyoko.
Música Keiichi Suzuki; Moonriders
Cinematografia Katsutoshi Sugai
Edição Takeshi Seyama Kashiko Kimura
Empresa de Produção Madhouse
Distribuição Sony Pictures Entertainment Japan
Data de lançamento 30 de agosto de 2003 (Big Apple Anime Fest);
8 de novembro de 2003 (Japão)
Tempo de execução 92 minutos
País Japão
Língua Japonesa
Orçamento $ 2,4 milhões 
Bilheteria $ 847.106 
Tokyo Godfathers foi produzido em 2003 e é, de longe, a obra de Satoshi que mais se distancia do estilo, conteúdo e construção narrativa de suas obras. Acostumado a fazer histórias que quebram os muros da realidade, Tokyo Godfathers abraça um estilo mais tradicional de storytelling ao invés das narrativas misturadas e não lineares como em seus outros filmes. Realizado quase como um desafio, essas mudanças foram não só estéticas ou puramente de roteiro, mas uma mudança de enquadramento proposital pelo qual enxergamos as aventuras e o mundo desta obra. Diferente de outros filmes, onde vemos o mundo e julgamos a sociedade e seus arredores pela visão distorcida e multi-temporal/dimensional da personagem principal, em Tokyo Godfathers somos forçados a ver o mundo pelos olhares e julgamentos desta sociedade sobre as personagens principais. A mudança polar de enquadramento é o que torna essa uma obra que, apesar de diferente, ainda tem a forte característica do diretor em sua base, sendo que ainda utiliza muito de seus conhecimentos sobre luz, simbologia, movimentação e construção de personagem para movimentar a história de maneira inconvencional.
O roteiro do filme conta a história de três moradores de rua de Tokyo, Hana, uma mulher trans e religiosa, ex-drag queen com forte ímpeto para defender quem ama, Miyuki, uma garota que fugiu de casa após esfaquear seu Pai devido um ambiente estressante e o desaparecimento de seu amado gato, e Gin, um homem que perdeu contato com sua família depois de se sentir humilhado por suas adições a álcool e jogos de azar. Na véspera de Natal, após algumas discussões, o grupo acha um bebê abandonado em um depósito de lixo e Hana decide tomar conta dele, apesar dos questionamentos dos outros. Ao encontrar com o bebê uma chave para um armário, o grupo vai a uma aventura para descobrir as origens da criança e tentar achar seus pais verdadeiros.
Todos os filmes de Satoshi demonstram aspectos desagradáveis da sociedade no japão, cenas e personagens que demonstram não tão sutilmente atitudes negativas e tóxicas que afetam diferentes grupos sociais. Em Tokyo Godfathers, esse olhar interessado e refinado de tais comportamentos está sempre escancarado no roteiro e nas atitudes das personagens. Hana, Gin e Miyuki representam, de forma geral, três dos grupos sociais mais marginalizados no japão: Os homens sem teto que escolhem morar na rua por medo de manchar sua honra e envergonhar sua família, a comunidade LGBT e as mulheres mais novas. Fora do nosso imaginário comum, estes três grupos sofrem repressões sistemáticas e individuais de forma inimaginável devido a influência da cultural local e da total falta de interesse de maior parte do governo para resolver estes conflitos, muitas vezes passados de baixo do pano pelo mesmo. Em uma das cenas mais frustrantes do filme, Gin é violentado por um grupo de adolescentes de classe média que fazem aquilo apenas por “diversão”. A cena para de utilizar os aspectos de comédia física e animações exageradas e fluidas para uma representação mais real do acontecimento, centrando a mensagem e focando no desespero real que essas pessoas sofrem constantemente, ainda por cima sendo cometidas pelo público mais provável de consumir as obras do diretor. Com todos estes aspectos, Tokyo Godfathers se torna também o filme mais publicamente político e social de seu catálogo.
Apesar de todas as dificuldades, preconceitos e micro-agressões sofridas pelas personagens principais, o filme é uma história sobre amor e esperança. Tanto a narrativa, banhada em alegorias religiosas, como as técnicas visuais implementadas por Satoshi parecem reforçar esta leitura. Durante o filme, todas as luzes são calculadas para representar a influência e presença do amor nas personagens. Os momentos em que as personagens estão no escuro refletem a sensação de falta ou perda, enquanto as personagens iluminadas muito frequentemente se encontram em alguma situação onde tal influência é claramente sentida de alguma forma. É possível ver isso em um dos primeiros momentos do filme quando o grupo descobre o bebê Kiyoko no lixo, em uma cena onde uma luz que parece sair do bebê iluminada fortemente os rostos das personagens, um sinal da representação de amor que é o bebê na trama. Depois da luz, o vento é um significante de esperança e, possivelmente, da presença de “deus”. Podemos ver que os momentos onde o vento se faz presente representam a vida e a esperança. É possível observar isto nas cenas do Gin com um velho homem que parece um espelho para seu futuro, onde o vento representa quase literalmente a vida do homem, e no final onde a luz e o vento esbaldam Hana depois de seu ato altruísta de salvar o bebê caindo de um prédio. Essas simbologias, além de visíveis, são bem fortes considerando a relação especial que os japoneses tem com o vento, como no termo kamizake, ou ventos divinos, que foi criado a partir de uma milagre acontecido em uma guerra entre o Japão e exércitos Mongóis, onde um tornado destruiu todo exército inimigo, criando então uma relação direta entre ventos e milagres. Sendo “kamizake” também conhecidos como uma frota de pilotos suicidas japoneses na segunda guerra, a ação de Hana em oferecer sua vida sem hesitação para salvar o bebê, depois ser salva pelo vento é, literalmente e simbolicamente, kamizake.
Cheio de absurdismos, Tokyo Godfathers é caótico, inesperado e imprevisível, e as técnicas de câmera muitas vezes representa isso. As ações do filme são recheados de sincronicidade, o que torna uma narrativa supostamente linear em um banquete de significados e explorações que podem não ser conectadas por relação causal, mas por seus significados. A justaposição desses elementos de realismo mágico e eventos absurdos também se contrapõem perfeitamente com as vidas das personagens retratadas, vidas cheias de absurdos e obstáculos inalcançáveis, desta vez sim, reais e criados pela própria sociedade em que eles se encontram.
análise comparativa
Os diretores escolhidos, Bong Joon-Ho e Satoshi Kon são ambos diretores asiáticos (coreano e japonês respectivamente) que começaram suas carreiras no final dos anos 90, aclamados por seus fãs por suas obras e famosos mundialmente. 
Suas perspectivas sobre filmes são extremamente parecidas: meios poderosos para contar histórias, introduzir ideias, conceitos e explorar, discutir e denunciar dinâmicas sociais e culturais do mundo onde vivemos. Todos os filmes de ambos diretores tem algum fator de análise/crítica social, seja de formas menos diretas e mais contextuais (como em Perfect Blue) ou em filmes onde o conflito de classes e conflito entre experiências culturais/sociais são a trama principal da história (como em Parasite ou Tokyo Godfathers). Tanto Bong quanto Satoshi parecem entender a importância não só da mensagem, mas da construção de uma boa narrativa que ajuda estas ideias florescer e transcender a mídia do cinema, sem cair em armadilhas de tratar a linguagem como “pura” ou inexplorável, criando então filmes não só inteligentes mas que entendem e valorizam seu papel como entretenimento.
É interessante notar que, além de abordar temas similares, as escolhas de gênero de seus filmes, ao comparar suas filmografias como um todo, também são peculiarmente similares. Ambos diretores costumam desenvolver filmes que tem mudanças drásticas em sua tonalidade durante a obra, como um filme de comédia virando um drama, um drama virando terror, um terror virando comédia e coisas similares. Acreditamos que isto é uma tentativa de nos acostumar com as personagens e relações que elas criam entre si (aspecto qual é super forte nas obras dos dois) para depois quebrar nossas expectativas de forma quase sadística, fazendo paralelos com o mundo real e potencializando as mensagens que os filmes nos passam, criando uma assinatura de “plot twists” entre suas obras. Além das semelhanças argumentativas e de construção de roteiro, ambos parecem utilizar muito bem de nuance, detalhe e profundidade em suas obras, desenvolvendo personagens muito bem construídas que habitam mundos igualmente bem pensados, criando um conflito longe do “bem e mal” e “preto e branco” que se vê em muitos outros filmes no meio, tendo assim situações onde o certo e o errado propositalmente não são fáceis de pontuar.
Como Satoshi trabalha com animação e Bong com cinema tradicional, é difícil traçar paralelos estéticos diretos entre seus estilos. Isso se torna então ainda mais difícil devido ao estilo característico de Satoshi de “matching cuts” e sua fama por usar a própria luz quase como personagem em suas histórias. Satoshi costuma associar elementos aparentemente banais em suas obras (como a luz e o vento) com conceitos abstratos como amor, vida, felicidade, enquanto Bong utiliza de metáforas visuais mais tradicionais, fazendo referências ao contexto e argumento da obra em si.
É bem clara a semelhança da influência dos diretores, dos clássico como Alfred Hitchcock à diretores menos conhecidos no ocidente, como o diretor japonês Kiyoshi Kurosawa. Sua origem asiática os permitem criar filmes que, para nós, são extremamente diferentes do costume Hollywoodiano norte-americano, tratando até de assuntos que são simplesmente ignorados em muitas obras ocidentais, como a diferença entre idiomas. É claro também que ambos tem um amor profundo pelo cinema através de obras como Millenium Actress de Satoshi e Parasite do Bong, filmes que parecem ser quase uma carta de amor à mídia.
As obras de Satoshi, por produzir animações no Japão, certamente tem um viés de espetáculo visual e entretenimento maior que as do Bong, considerando que para muitos a animação nem é vista como uma forma válida de expressão cinematográfica, e mais como apenas um entretenimento inferior e mais voltado aos fins monetários. Apesar disso, é claro que ambos fazem um esforço enorme para sair dos moldes tradicionais de suas respectivas áreas, demonstrado pela incrível profundidade técnica e temática de seus trabalhos, que conquistaram Bong a primeira vitória estrangeira do Oscar na categoria de melhor filme.
Suas diferenças, mesmo com meios tecnicamente diferentes de produção, são bem pequenas. As obras de Bong, por exemplo, parecem muito mais aterradas e diretas a realidade que as obras de Satoshi, fator essencial em seus filmes que nos desarma de elementos sobrenaturais aleatórios para nos trazer ao duro e sangrento da realidade em que vivemos, enquanto Satoshi usa destes para desenvolver suas personagens de maneiras não convencionais e excelentemente visuais.
É interessante comparar obras tão similares em substância e tão diferentes em estilo, filmes que nos trazem por jornadas emocionais muito distintas, e ainda sim observar a nuance com qual ambos diretores tratam seus projetos, e os insights que eles nos trazem sobre a nossa sociedade mesmo relatando acontecimentos de uma cultura tão discrepante com a nossa. Acreditamos que esses diretores trazem uma perspectiva “nova” tanto no fazer de filmes em si quanto nos temas que eles abordam, e são apenas uma dupla de exemplos de dezenas de diretores incríveis que provavelmente não conhecemos por não serem estadunidenses e/ou diretores de produções multimilionárias. A multiplicidade da cultura de forma geral é super importante, e para o cinema, estes são ótimos exemplos.
bibliografia e referências
BRAZ, Rafael.
Quem é Bong Joon Ho, o coreano que fez história no Oscar com "Parasita"?. Disponível em: <https://www.agazeta.com.br/colunas/rafael-braz/quem-e-bong-joon-ho-o-coreano-que-fez-historia-no-oscar-com-parasita-0220>. Acesso em: 14.10.2020.

REIS, Camila. Conheça os filmes que inspiram Bong Joon-ho, o diretor de “Parasita”. Disponível em: <https://revistakoreain.com.br/2020/02/conheca-os-filmes-que-inspiram-bong-joon-ho-o-diretor-de-parasita/>. Acesso em 14.10.2020.
NUSSMAN, Jessie. Beginner’s Guide: Bong Joon-ho, Writer & Director. <https://www.filminquiry.com/beginners-guide-bong-joon-ho/ >. Acesso em 15.10.2020.
ARÊDE, Laila.
Satoshi Kon e seu legado para o cinema de animação. Disponível em: <https://designculture.com.br/satoshi-kon-e-seu-legado-para-o-cinema-de-animacao>. Acesso em 14.10.2020.

WATTS, Rachel. The Beginner’s Guide: Satoshi Kon, Director. Disponível em: <https://www.filminquiry.com/the-beginners-guide-satoshi-kon/ >. Acesso em 15.10.2020.
ALVES, Rafaela.
Okja [resenha do filme]. Disponível em: <https://www.oquetemnanossaestante.com.br/2017/07/okja-resenha-do-filme.html>. Acesso em 15.10.2020.
MACIEL, Thiago.
Okja, da Netflix, emociona, diverte e faz crítica à sociedade. <https://super.abril.com.br/blog/turma-do-fundao/okja-da-netflix-emociona-diverte-e-faz-critica-a-sociedade> . Acesso em 15.10.2020.

A QUARTA PAREDE. Perfect Blue (1997) e a confusão vermelha. Disponível em: <https://medium.com/@a4parede/perfect-blue-1997-e-a-confus%C3%A3o-vermelha-47822b739414>. Acesso em 20.10.2020.
EVERY FRAME A PAINTING. Satoshi Kon - Editing Space & Time. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=oz49vQwSoTE&ab_channel=EveryFrameaPainting>. Acesso em 25.10.2020.
STEVEM. The Surreal Mind of Satoshi Kon | Paprika. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=fJ0kBKSkBXM&ab_channel=STEVEM> . Acesso em 25.10.2020.
BREADSWORD. Satoshi Kon and Why Love Is All You Need Ep. 1 - Perfect Blue. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=2XGYr9_BiEU&t=154s&ab_channel=BREADSWORD> . Acesso em 28.10.2020.
BREADSWORD. Satoshi Kon and Why Love Is All You Need Ep. 3 - Tokyo Godfathers. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=9EceEemWo0k&ab_channel=BREADSWORD> Acesso em 30.10.2020.
What's So Great About That?. Paprika: The Storm of Progress. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=XMonh0QyKHs&ab_channel=What%27sSoGreatAboutThat%3F> Acesso em 01.11.2020.
Browntable. Why It Works: Bong Joon-ho's SNOWPIERCER | Analysis. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=FYGONRRF9FI> Acesso em 01.11.2020
Every Frame a Painting. Snowpiercer - Left or Right. Disponível em: <http://youtube.com/watch?v=X05TDsoSg2Y%20nowpiercer%20-%20Left%20or%20Right> Acesso em 01.11.2020

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